Em sua sabedoria, Deus imprimiu à
natureza elementos, opostos em sua essência, como dia e noite, inverno e verão,
claro e escuro, frio e calor, que são
absolutamente necessários para a vida dos seres criados. Na sua homilia,
na Vigília da Páscoa, Bento XVI, na clareza, simplicidade e densidade de sua
palavra, destacou, por exemplo, a linguagem bíblica, espiritual e antropológica
da escuridão e da iluminação, cuja reprodução, seguramente, será útil ao
leitor: “A escuridão que verdadeiramente ameaça o homem é o fato de que ele é,
na verdade, capaz de ver e investigar as coisas palpáveis, materiais, mas não
vê para onde vai o mundo e donde o mesmo venha; para onde vai a sua própria
vida; o que é o bem e o que é o mal. Esta
escuridão acerca de Deus e a escuridão acerca dos valores são a verdadeira
ameaça para a nossa existência e para o mundo em geral. Se Deus e os
valores, a diferença entre o bem e o mal permanecem na escuridão, então todas
as outras iluminações, que nos dão um poder verdadeiramente incrível, deixam de
constituir somente progressos, mas passam a ser simultaneamente ameaças que nos
põem em perigo a nós e ao mundo. Hoje podemos iluminar as nossas cidades de
modo tão deslumbrante que as estrelas do céu deixam de ser visíveis. Porventura
não temos aqui uma imagem da problemática que toca o nosso ser iluminado? Nas
coisas materiais, sabemos e podemos incrivelmente tanto, mas naquilo que está
para além disto, como Deus e o bem, já não o conseguimos individuar. Para isto serve a fé, que nos mostra a luz de
Deus, a verdadeira iluminação: aquela é uma irrupção da luz de Deus no nosso
mundo, uma abertura dos nossos olhos à verdadeira luz. Por fim, queridos
amigos, queria ainda acrescentar um pensamento sobre a luz e a iluminação. Na Vigília
Pascal, a noite da nova criação, a Igreja presenta o mistério da luz com um
símbolo muito particular e humilde: o Círio Pascal. Trata-se de uma luz que
vive em virtude do sacrifício: a vela ilumina, consumindo-se a si mesma; dá
luz, dando-se a si mesma. Este é um modo maravilhoso de representar o mistério
pascal de Cristo, que Se dá a Si mesmo e assim dá a grande luz. Uma segunda ideia,
que a reflexão sobre luz da vela nos sugere, deriva do fato de a mesma ser
fogo. Ora, o fogo é força que plasma o mundo, poder que transforma; e o fogo dá
calor. E aqui se torna novamente visível o mistério de Cristo: Ele, a luz, é
fogo; é chama que queima o mal, transformando assim o mundo e a nós mesmos. ‘Quem
está perto de Mim, está perto do fogo’: assim reza um dito de Jesus, que nos
foi transmitido por Orígenes. E este fogo é ao mesmo tempo calor: não uma luz
fria, mas uma luz na qual vêm ao nosso encontro o calor e a bondade de Deus. O
grande hino da proclamação da Páscoa, de modo muito discreto chama a nossa atenção
ainda para outro aspecto. Lembra-nos que o material do círio se fica a dever,
em primeiro lugar, ao trabalho das abelhas; e, assim, entra em cena a criação
inteira. No círio, a criação torna-se portadora de luz. Mas, segundo o
pensamento dos Padres, temos aí também uma alusão implícita à Igreja. Nesta, a
cooperação da comunidade viva dos fiéis é parecida com o trabalho das abelhas;
constrói a comunidade da luz. Assim podemos ver, no círio, também um apelo
dirigido a nós mesmos e à nossa comunhão com a comunidade da Igreja, que existe
para que a luz de Cristo possa iluminar o mundo.”
A
escuridão e a iluminação são necessárias ao bem-estar e sobrevivência da
natureza; à luz da Páscoa, é preciso identificar que linguagem têm na
convivência humana e no relacionamento com Deus.
Dom Genival Saraiva de França é Bispo da Diocese de Palmares - PE; Presidente da Conferência Nacional de Bispos Regional Nordeste 2 (CNBB NE2), Responsável pela Comissão Regional de Pastoral para o Serviço da Caridade, da Justiça e da Paz; Diretor presidente do Conselho de Orientação do Ensino Religioso do Estado de Pernambuco (CONOERPE); Membro efetivo do Conselho Econômico da CNBB NE2.






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