terça-feira, 19 de junho de 2012

Festa perdulária?

O calendário junino envolve o povo nordestino num clima de festejos que não têm fim. Na Paraíba e em Pernambuco o “São João” é muito mais alegre e concorrido do que as comemorações do Natal de Jesus. No entanto, a alegria espontânea das festas juninas trilha um rumo semelhante ao do Carnaval, hoje, mercantilizado. A forte marca comercial invadiu as festas juninas, substituindo as antigas tradições, sem maiores vínculos com a cultura religiosa. A cada ano se nota mais distantes da originalidade do regionalismo nordestino; bandas de forró de plástico e produções artísticas duvidosas deturpam o folclore nativo. Até os santos do calendário junino parecem se aposentar. As produções artísticas empresariais impõem aparatos que implicam em gastos altíssimos, geralmente bancados pelas prefeituras. A sofisticação das festas juninas deve-se à concorrência entre as diversas empresas que promovem a cultura artificializada ao sabor das modas lançadas com fins comerciais. Vai-se embora a antiga festa familiar.

Quando o lucro torna-se o maior objetivo, evidentemente as plateias se voltam para os excessos e não para o congraçamento entre as famílias. Empresários justificam a sofisticação com a pluralidade de atrações, ainda que seja com forró de plástico e bandas com ritmos plurais. Embora ainda o povo priorize e até exija a atuação dos artistas da terra, o pé-de-serra, as comidas típicas, nota-se que a grande preocupação dos políticos e dos empresários é mobilizar populares e a expectativa de bombástico retorno financeiro. O que fica para os bolsos dos empresários e para os cofres da administração pública só Deus sabe. Pensemos na forte pressão que os políticos e empresários exercem sobre os governos estaduais e municipais para que patrocinem as festas com o dinheiro público. Produções artísticas sofisticadas absorvem verbas públicas - vá se provar se há retorno em forma de melhorias de serviços prestados à população, sobretudo a mais carente. Enfrentamos uma seca braba em 190 municípios paraibanos. Promover festanças exageradas destinando verbas num tempo de seca...

Não deveríamos correr atrás dos prejuízos, prever obras de infraestrutura inexistentes, socorrer milhares de famílias, sobretudo pobres, com fome, sede, desnutrição, por vezes sem ocupação e renda? Sei que o povo gosta de festas e não há grandes reações por parte da maioria que adora as festas de São João. Essas festas pouco conservam o valor religioso primitivo, trazido pelos portugueses, miscigenados com traços culturais de indígenas e negros. A mistura fina das culturas com raízes sacras e profanas espelharam o rosto do povo por muito tempo. Não sou a favor do “rebusque” dos festejos juninos, com o risco inegável de perder seu caráter genuíno. Festa popular, sim. O que a gente não consegue aceitar é a alienação e a morte da cultura genuína.




Dom Aldo Di Cillo Pagotto é Arcebispo da Arquidiocese da Paraíba.


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