terça-feira, 6 de dezembro de 2011

Vindas de Cristo - Dom Genival Saraiva

No início e no término do Ano Litúrgico, em sua sabedoria materna, a Igreja coloca na oração dos fiéis a reflexão sobre a questão da finitude das realidades temporais e da pessoa humana, em face das “coisas futuras” (Escatologia). As coisas criadas, embora finitas e tendo o mesmo Deus como seu criador, não têm a mesma destinação. Com efeito, há coisas que simplesmente passaram, passam ou hão de passar, mesmo consideradas estupendas, em sua grandeza, como a imensidão dos mares, em sua harmonia, como o sistema interplanetário, em sua história, como milenares obras arquitônicas. As coisas materiais passam com o desgaste natural ou pela destruição provocada pelas mais variadas causas.


Há criaturas, perfeitas na sua ordem, por serem dotadas de um “princípio vital”, expressão usual na psicologia escolástica para se referir à alma, que não subsistem, não sobrevivem, ao dar-se o fenômeno da morte, como ocorre no “reino animal”. Entre as criaturas, uma não se esgota no espaço e no tempo: a pessoa humana que não passa, apesar de sua finitude. Eis o grande diferencial na criação: o ser humano. Apenas concebido, como embrião, é mais importante do que o “urso polar em extinção”, no Alaska, de “tartarugas de esporas africanas (...) em risco de extinção” ou de mico-leão-dourado, “em risco de extinção”, no Brasil. Concebido com anencefalia, o embrião, em vista de seu desenvolvimento e nascimento, tem direito a mais cuidados, por parte da família e dos profissionais da saúde, do que aquele dispensado por ambientalistas e biólogos à desova de tartarugas: “uma tartaruga gigante foi flagrada em processo de desova na praia da Pedra do Sal”, no Piauí.

O mundo criado tem uma importância inquestionável, precisamente, porque “vem das mãos de Deus”; por isso, Santo Tomás de Aquino, em “sua obra põe os fundamentos sólidos de uma teologia das realidades terrestres, em respeito aos valores humanos”. Na interação harmoniosa que estabeleceu no paraíso, conforme o ensinamento do Gênesis, Deus colocou o ser humano num estado de supremacia, em relação às demais criaturas, distinguindo-o com muitos dons: a graça santificante, a imortalidade, a ausência de sofrimento, o conhecimento de sua condição e responsabilidade. O pecado original, porém, trouxe consequências para o homem e para o mundo: a perda da graça santificante, tensão no relacionamento entre o homem e mulher, hereditariedade do pecado original, luta pela subsistência, com o “suor do rosto”, rompimento da harmonia com a criação.

A primeira vinda de Cristo ao mundo, como Redentor, cujo mistério a Igreja celebra nesse tempo de Advento, deu-se em razão do pecado original. Como ensina a doutrina católica, a humanização de Cristo o assemelha ao homem, em tudo, à exceção do pecado: “De fato, não temos um sumo sacerdote incapaz de se compadecer de nossas fraquezas, pois ele mesmo foi provado em tudo, à nossa semelhança, sem todavia pecar.” (Hb 4,15)

A segunda vinda de Cristo será para “julgar os vivos e os mortos”, dada a sua vocação de eternidade, a condição de imortalidade e a graça da ressurreição, como reza a Igreja na oração do “Creio”. A vida eterna é a mais profunda experiência de comunhão da pessoa humana com Deus. “Que prazer estar ali, no reino celeste, sem medo da morte, tendo a vida para sempre! Que imensa e inesgotável felicidade”. (São Cipriano, bispo e mártir, séc. III). Esse é o Natal da eternidade que a humanidade espera!

Dom Genival Saraiva de França é Bispo da Diocese de Palmares - PE; Presidente da Conferência Nacional de Bispos Regional Nordeste 2 (CNBB NE2), Responsável pela Comissão Regional de Pastoral para o Serviço da Caridade, da Justiça e da Paz; Diretor presidente do Conselho de Orientação do Ensino Religioso do Estado de Pernambuco (CONOERPE); Membro efetivo do Conselho Econômico da CNBB NE2.

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