sexta-feira, 18 de abril de 2014

Homilia do Papa na Quinta-Feira Santa



Queridos irmãos no sacerdócio!

No dia de hoje, Quinta-Feira Santa, quando Cristo nos amou até o extremo (cf. Jo 13,1), fazemos memória do dia feliz da instituição do sacerdócio e daquele da nossa Ordenação sacerdotal. O Senhor ungiu-nos em Cristo com óleo de alegria e esta unção nos convida a receber e a acolher este grande dom: a alegria, a letícia sacerdotal. A alegria do sacerdote é um bem precioso não somente para ele, mas também para todo o povo fiel de Deus: aquele povo fiel, em meio ao qual é chamado o sacerdote para ser ungido e ao qual é enviado para ungir.

Ungidos com óleo de alegria, para ungir com óleo de alegria. A alegria sacerdotal tem a sua fonte no Amor do Pai, e o Senhor deseja que a alegria deste Amor “esteja em nós” e “seja plena” (Jo 15,11).  Gosto de pensar na alegria, contemplando Nossa Senhora: Maria, a “mãe do Evangelho vivente, é fonte de alegria para os pequenos” (Exort. Apost. Evangelli gaudium, 288), e creio não exagerar ao dizer que o sacerdote é uma pessoa muito pequena: a incomensurável grandeza do dom que nos é dado para o ministério coloca-nos entre os menores dos homens. O sacerdote é o mais pobre dos seres humanos, se Jesus não o enriquece com a sua pobreza, é o mais inútil servo se Jesus não o chama amigo, o mais estulto dos homens se Jesus não o instrui pacientemente como Pedro, o mais indefeso dos cristãos se o Bom Pastor não o fortifica em meio ao rebanho. Ninguém é menor do que um sacerdote abandonado às suas próprias forças; por isso a nossa oração de defesa contra toda insídia do Maligno é a oração de nossa Mãe: sou sacerdote porque Ele olhou com bondade para a minha pequenez (cf. Lc 1,48). E a partir de tal pequenez acolhemos a nossa alegria. Alegria na nossa pequenez!

Eu encontro três características significativas na nossa alegria sacerdotal: é uma alegria que nos unge (não que nos torne afetados, suntuosos e presunçosos), é uma alegria incorruptível e é uma alegria missionária que se irradia a todos e atrai todos, começando ao contrário: pelos mais distantes.

Uma alegria que nos unge. Isto é: penetrada no íntimo do nosso coração, configurou-o e o fortaleceu sacramentalmente. Os sinais da liturgia da ordenação nos falam do desejo materno que tem a Igreja de transmitir e comunicar tudo aquilo que o Senhor nos deu: a imposição das mãos, a unção com o santo Crisma, o revestir com os paramentos sagrados, a participação imediata na primeira Consagração... A graça nos preenche e se efunde íntegra, abundante e plena para cada sacerdote. Ungidos até os ossos... e a nossa alegria, que brota de dentro, é o eco desta unção.

Uma alegria incorruptível. A integridade do Dom, ao qual ninguém pode tirar ou acrescentar nada, é fonte incessante de alegria: uma alegria incorruptível, que o Senhor prometeu que ninguém poderá tira-la de nós (cf. Jo 16,22). Pode ser adormecida ou sufocada pelo pecado e pelas preocupações da vida, mas, no profundo, permanece intacta como as brasas de um tronco queimado sob as cinzas, e sempre pode ser renovada. A recomendação de Paulo a Timóteo permanece sempre atual: Recorda-te de reavivar o fogo do dom de Deus que está em ti pela imposição das minhas mãos (cf. 2 Tm 1,6).

Uma alegria missionária. Esta terceira característica quero partilha-la e realçar de modo especial: a alegria do sacerdote é colocada em íntima relação com o santo povo fiel de Deus porque se trata de uma alegria eminentemente missionária. A unção é em ordem a ungir o santo povo fiel de Deus: para batizar e confirmar, para curar e consagrar, para abençoar, para consolar e evangelizar.

E porque é uma alegria que flui somente quando o pastor está no meio do seu rebanho (também no silêncio da oração, o pastor que adora o Pai está no meio de suas ovelhas) e por isso é uma “alegria guardada” por este mesmo rebanho. Também nos momentos de tristeza, em que tudo parece obscurecer-se e a vertigem do isolamento nos seduz, aqueles momentos apáticos e sem graça que às vezes nos colhem na vida sacerdotal (e através dos quais também eu passei), até mesmo nestes momentos o povo de Deus é capaz de guardar a alegria, é capaz de proteger-te, de abraçar-te, de te ajudar a abrir o coração e reencontrar uma alegria renovada.

“Alegria guardada” pelo rebanho e guardada também por três irmãs que a circundam, a protegem e a defendem: irmã pobreza, irmã fidelidade e irmã obediência.

A alegria do sacerdote é uma alegria que tem como irmã a pobreza. O sacerdote é pobre de alegria meramente humana: renunciou a tanta coisa! E porque é pobre, ele, que dá tantas coisas aos outros, a sua alegria ele deve pedi-la ao Senhor e ao povo fiel de Deus. Não deve procura-la por si. Sabemos que o nosso povo é generosíssimo em agradecer os sacerdotes pelos mínimos gestos de benção e, de modo especial, pelos Sacramentos. Muitos, falando da crise de identidade sacerdotal, não levam em consideração que identidade pressupõe pertença. Não existe identidade – e portanto alegria de viver – sem pertença ativa e comprometida ao povo fiel de Deus (cf. Exort. Apost. Evangelli gaudium, 268). O sacerdote que pretende encontrar a identidade sacerdotal indagando introspectivamente na própria interioridade talvez não encontre outra coisa que sinais que pedem “saída”: sai de ti mesmo, sai à procura de Deus na adoração, sai e dá ao teu povo aquilo que te foi confiado, e o teu povo terá o cuidado de te fazer sentir e provar quem tu és, como te chamas, qual é a tua identidade, e te fará alegre com o cem por um que o Senhor prometeu aos seus servos. Se não sais de ti mesmo, o óleo torna-se rançoso e a unção não pode ser fecunda. Sair de si mesmos exige despojar-se de si, traz consigo pobreza.

A alegria sacerdotal é uma alegria que tem como irmã a fidelidade. Não tanto no sentido de que seremos todos “imaculados” (oxalá o fossemos com a graça de Deus!) porque somos pecadores, mas antes no sentido de uma sempre nova fidelidade à única Esposa, a Igreja. Aqui está a chave da fecundidade. Os filhos espirituais que o Senhor dá a cada sacerdote, aqueles que ele batizou, as famílias que ele abençoou e ajudou a caminhar, os doentes que apoia, os jovens com quem partilha a catequese e a formação, os pobres que socorre.... são esta Esposa que ele é feliz de tratar como predileta e única amada e de ser-lhe sempre novamente fiel. É a Igreja viva, com nome e sobrenome, da qual o sacerdote cuida na sua paróquia ou na missão que lhe é confiada, é ela que lhe dá alegria, quando ele lhe é fiel, quando faz tudo aquilo que deve fazer e deixa tudo aquilo que deve deixar a fim de permanecer em meio às ovelhas que o Senhor lhe confiou: “Apascenta as minhas ovelhas” (Jo 21,16.17).

A alegria sacerdotal é uma alegria que tem como irmã a obediência. Obediência à Igreja na Hierarquia que nos dá, por assim dizer, não somente o âmbito mais externo da obediência: a paróquia à qual sou enviado, as faculdades do ministério, aquele encargo específico... mas também a união com Deus Pai, da qual deriva toda paternidade. Mas também a obediência à Igreja no serviço: disponibilidade e prontidão para servir a todos, sempre e no melhor modo, à imagem de “Nossa Senhora da prontidão” (cf. Lc 1,39: meta spoudes), que acorre a servir a sua prima e está atenta à cozinha de Caná, onde falta o vinho. A disponibilidade do sacerdote faz da Igreja a Casa das portas abertas, refúgio para os pecadores, lar para quantos vivem pelas estradas, casa de cura para os enfermos, acampamento para os jovens, aula de catequese para os pequenos da primeira comunhão... Onde o povo de Deus tem um desejo ou uma necessidade, lá está o sacerdote que sabe escutar (ob-audire) e sente um mandato amoroso de Cristo que o manda socorrer com misericórdia aquela necessidade ou apoiar aqueles bons desejos com caridade criativa.

Aquele que é chamado saiba que existe neste mundo uma alegria genuína e plena: a de ser tomado do povo que ama, para ser enviado a ele como dispensador dos dons e das consolações de Jesus, o único Bom Pastor que, pleno de profunda compaixão por todos os pequeninos e excluídos desta terra, cansados e oprimidos como ovelhas sem pastor, quis associar muitos ao seu ministério para permanecer e agir Ele mesmo, na pessoa dos seus sacerdotes, para o bem do seu povo.

Nesta Quinta-feira Santa peço ao Senhor Jesus que faça descobrir a muitos jovens aquele ardor do coração que faz arder a alegria tão logo alguém tenha a feliz audácia de responder com prontidão à sua chamada.

Nesta Quinta-feira Santa peço ao Senhor Jesus que conserve o brilho alegre nos olhos dos recém ordenados, que partem para se deixar consumir em meio ao povo fiel de Deus, que se alegram preparando a primeira homilia, a primeira Missa, o primeiro Batismo, a primeira Confissão... É a alegria de poder partilhar – cheios de maravilha – pela primeira vez como ungidos, o tesouro do Evangelho e sentir que o povo fiel torna a ungir-te de outra maneira: com os seus pedidos, apresentando-te a cabeça para que o abençoe, apertando-te as mãos, aproximando-te de seus filhos, pedindo por seus enfermos... Conserva, Senhor, nos teus sacerdotes jovens a alegria da partida, de fazer cada coisa como se fosse nova, a alegria de consumir a vida por ti.

Nesta Quinta-Feira sacerdotal peço ao Senhor Jesus que confirme a alegria sacerdotal daqueles que tem muitos anos de ministério. Aquela alegria que, sem desaparecer dos olhos, apoia-se sobre os ombros de quantos suportam o peso do ministério, daqueles padres que se consumiram no trabalho, recolhem as suas forças e se rearmam: “mudam de ar”, como dizem os esportivos. Conserva, Senhor, a profundidade e a sábia maturidade da alegria dos padres adultos. Saibam rezar como Neemias: a alegria do Senhor é a minha força (cf. Ne 8.10).

Enfim, nesta Quinta-Feira sacerdotal, peço ao Senhor Jesus que resplandeça a alegria dos sacerdotes anciãos, sãos ou enfermos. É a alegria da Cruz, que provém da consciência de ter um tesouro incorruptível em um vaso de barro que vai se desfazendo. Saibam estar bem em qualquer lugar, sentindo na fugacidade do tempo o gosto do eterno (Guardini). Sintam, Senhor, a alegria de passar a chama, a alegria de ver crescer os filhos dos filhos e de saudar, sorrindo e com mansidão, as promessas, naquela esperança que não desilude.

1 comentários:

Que graça, que alegria a homilia do nosso Santo Padre, Papa Francisco em nos apontar as características fundamentais da alegria Sacerdotal: Ungido, incorruptível e missionário. creio nasceu na Cruz de Jesus! Afinal, o Sacerdote é para ungir o santo povo fiel de Deus, batizando-nos e confirmando-nos na Fé Trinitária, além de nos curar e consagrar, para abençoar, para consolar e evangelizar. Que Graça a prsença de um Sacerdote no seio da comunidade Cristã! Feliz Páscoa Papa Francisco e todos os representantes de Jesus, os Sacerdotes. abraços fraternos, ZéCA - Coord. Dioc. Catequese - Petrolina/PE.

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