A cidadania é um ato de pertença da
pessoa a um município, estado ou nação, decorrente do seu nascimento ou da
concessão por parte do poder competente. Há muitos elementos compreendidos na
cidadania, a começar pela dimensão afetiva. Via de regra, no tocante à
naturalidade, é muito viva a relação do cidadão com suas origens, por menor que
seja e mais desconhecido que seja o lugar de seu nascimento; isso se manifesta
de muitas maneiras, haja vista o retorno à sua terra em ocasiões especiais; o
cidadão nato tem, igualmente, um vínculo político com sua nacionalidade, daí o
amor ao seu país ser expresso, afetivamente, pela reverência aos seus símbolos
e de sua exaltação, por exemplo, durante campeonatos esportivos e outros
eventos entre nações. O título de cidadania fala, intensamente, ao coração de
quem foi distinguido por essa concessão, por representar a certeza de sua
identificação com esse espaço e pelo reconhecimento dessa inserção, por parte
do poder concedente. Em razão dos traços cívicos, culturais e políticos que se
estabelecem, a cidadania nata tem sempre um grande sentido na vida do cidadão e
a adquirida sempre é portadora de grande significado para quem a recebe.
O cidadão cristão é estimulado a ver
sua pertença a determinado município, estado ou país através da dimensão
religiosa. Nesse sentido, sob o prisma humano, o período natalino é muito
propício para se fazer a leitura da importância da cidadania, graças ao
espírito de fraternidade e solidariedade que suscita na mente e no coração das
pessoas. Todavia, a importância maior dessa visão religiosa da cidadania reside
no fato de conter uma dimensão mais profunda – a Encarnação de Jesus. Por esse
mistério, o Filho de Deus, eterno como o pai e o Espírito Santo, humaniza-se no
tempo e se torna semelhante a qualquer pessoa, à exceção do pecado, com ensina
a Carta aos Hebreus: “ele mesmo foi provado em tudo, à nossa semelhança, sem
todavia pecar.” (Hb 4,15) Essa semelhança começa pela concepção de Jesus no
ventre de Maria, embora não tenha existido a contribuição paterna, uma vez que
a gravidez se deu “por obra do Espírito Santo”, como reza a Igreja na oração do
“Creio”. No entanto, o mistério da Encarnação de Jesus não quis dispensar a
participação materna e, por isso, como celebra a Liturgia da festa da Imaculada
Conceição, no dia oito de dezembro, Maria foi isenta do pecado original “em
previsão dos méritos de Cristo”.
A cidadania terrestre não
representou um desmerecimento para Jesus porque, como ensina a Carta aos
Filipenses, “Ele, existindo em forma divina, não se apegou ao ser igual a Deus,
mas despojou-se assumindo a forma de escravo e tornando-se semelhante ao ser
humano.” (Fl 2, 6-7) O Natal, porém, recorda à humanidade que o nascimento de
Cristo, além de trazer dignidade à sua cidadania terrestre, conferiu-lhe o
direito de pertença à cidadania eterna. Ao viver em sua comunidade a preparação
e a celebração do Natal do Senhor, o cristão, enquanto vive no tempo, toma
consciência do valor de sua cidadania terrestre e de sua missão. Por sinal, a
Novena de Natal do Regional Nordeste 2 deste ano aponta essa direção aos
cristãos :“A comunidade dos discípulos de Jesus é lugar de solidariedade, onde
os esquecidos são lembrados e podem encontrar nova esperança e nova vida. É
preciso acolher estes nossos irmãos e irmãs, injustiçados e injustiçadas:
presos, torturados, vítimas de todo tipo de tráfico humano, dependentes
químicos, doentes e abandonados.” A cidadania celeste, que é pura e plena
gratuidade divina, está sempre associada ao Natal de Jesus que veio ao mundo
para salvar a todos.
Dom Genival Saraiva
Bispo Emérito de Palmares - PE
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